20 de outubro de 2010

Fala Fernando Pessoa

Quando não tenho inspiração deixo outro poeta

falar por mim. Fala Fernando Pessoa:

Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem acabei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não atem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,
Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.
Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que sogue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo: “Fui eu?”
Deus sabe, porque o escreveu.

18 de outubro de 2010

no meu travesseiro não

o conforto seguro

o sono profundo

dentro do travesseiro

eu durmo

dentro das minhas idéias

há tesouros pesados

há memórias cravadas, há espaços em branco

em dimensões da infância e juventude

minha memória se perde

uma outra se consititui

talvez

a vida inteira

esteja dentro de algum sonho

pois dentro do meu travesseiro não está.

Ser

Se o ter é porto seguro

o ser é déspota incorrígivel

é um reencontrar-se antigo

com sua essência, suas origens

suas cores, sua luz que lhe é própria

o ter não é o mal maior

mas é um mar desatinado cheio de armadilhas

às vezes o ter sucumbi o ser.